sábado, 12 de julho de 2014

Novo manual "Regras básicas do pelotão"?!


Aproveitando mais uma noite de insónia deixo-vos aqui mais uma crónica.
Bem, tecnicamente não será bem uma insónia. Simplesmente ainda não consegui adaptar o meu fuso horário aos horários das competições nacionais. Desde que me lembro, a minha hora de despertar nunca foi depois das 8h00. As etapas nos anos 90, regra geral começavam por volta das 10h00-11h00, como a nossa regra é fazer a última refeição cerca de 3h-2h30 antes, significa que acordávamos por volta das 6h30-7h30. Em 2004 quando deixei a alta competição, comecei a despertar ainda mais cedo. Em 2005 e 2006 porque tinha à minha responsabilidade uma equipa profissional de ciclismo, a Riberalves/GoldNutrition (2005) e depois Riberalves/Alcobaça (2006). Nestes dois anos dormia em média cerca de 6 horas. Não havia tempo para mais!. Além de diretor desportivo, era o treinador de praticamente todos os ciclistas da equipa, e como se não bastasse, era o responsável pelo marketing e relações públicas da equipa. Mesmo assim, ainda arranjava tempo para treinar (corrida) cerca de uma hora todos os dias. O despertador tocava quase sempre às 6 da manhã.

Em 2007 achámos por bem ceder o patrocínio da marca Riberalves a uma outra equipa nacional – a Riberalves/Boavista. Assim fiquei bem mais liberto, pois era apenas o responsável pelo marketing e relações públicas desta equipa. Nesta fase entrei também para os quadros da GoldNutrition. Até então era apenas consultor desta marca nacional. Mas a minha hora de despertar não mudou muito, passou para as 7 da manhã.

Em 2008 deixei as funções em equipas de ciclismo e dediquei-me de corpo e alma à GoldNutrition e à GMTSports (treino de ciclistas). Isto não alterou em nada os meus hábitos no que respeita a horários. Deitar por volta da meia-noite e acordar às 7h00. Foi neste ano que comecei a fazer BTT com mais regularidade. Aproveitava os fins-de-semana livres, e por vezes durante a semana treinava nos rolos ao final da tarde.

Agora de repente tudo tem que mudar! As etapas nunca têm início antes das 11h00, aliás, a maioria só começa depois do meio-dia! Isto obriga a que eu tenha que dormir até às 9h00-10h00! Mas não consigo! Mesmo que me deite às 0h30, como ontem, ou melhor, como hoje, o meu alarme biológico toca o mais tardar às 7h30, quando não é antes! Será a velhice, ou será os muitos anos de rotina?!

Bem, assim sendo, resta-me aproveitar as duas horas que faltam até ao pequeno-almoço/almoço, que hoje está marcado para as 10h00, e fazer algo útil.

Neste momento estou na famosa, pelo menos para os ciclistas, Residencial Braga no Vimeiro. O Sr. Duarte, proprietário deste estabelecimento, é um grande adepto de ciclismo. Muitas equipas ficam instaladas nesta residencial, porque somos tratados como...futebolistas?! Brincadeira, somos sim tratados com MUITA simpatia a baixos preços, aspecto essencial para as equipas nacionais.

Falando do Troféu Joaquim Agostinho. Uma competição de 4 dias que se desenrola na região litoral oeste, estradas onde costumo treinar. Aliás, ontem passamos a 1000 metros de minha casa.
No primeiro dia, fizemos um contra-relógio individual de 7,5 quilómetros. Se fosse nos meus tempos áureos, teria disputado a vitória neste exercício. Aliás, tenho no meu palmarés duas vitórias em contra-relógios neste Troféu. Mas agora os tempos são outros, a disponibilidade física é bem menor, sobretudo nestes esforços mais curtos mas bem mais intensos. Terminei esta etapa num modesto 35º lugar. “Modesto” para aquilo que estava habituado. As minhas sensações durante o crono nem foram más e apliquei-me a 100%, não fui a passear. Mas o corpo não deu mesmo para mais! Terminei o contra-relógio com a “boca a saber a sangue”.

Ontem tivemos pela frente uma etapa com 170km e 2800 de subida acumulada. O meu quintal é tramado! Sempre muito ventoso e um terreno de sobe e desce constante! E as estradas estão em muito mau estado. Remendos no asfalto, tampas de esgoto desniveladas, bermas sujas ou muito baixas, enfim, imaginem um pelotão de 130 ciclistas a 40-60 à hora, muito nervoso, a rolar nestas estradas! O meu coração vai sempre nas mãos!

Em quase todas as competições que tenho participado, desde o mês passado, experimento novas sensações e situações. Ontem assisti a um embate entre Rússia e Colômbia. Não, não tem a ver com o mundial de futebol, mas sim com kickboxing. A determinado momento da etapa, dois ciclistas destas equipas pegaram-se literalmente, por causa da disputa de um reduzido espaço no pelotão! É verdade, um espaço na via pública. Mas sobre isto já vos explico. Bem, foi mesmo à minha frente. Primeiro começaram às cotoveladas, depois aos empurrões, até que o russo desequilibrou-se e mandou um valente trambolhão! Eu escapei por um triz. Isto tudo a 40km/h! Depois vieram os colegas russos a quererem ajustar contas com o colombiano, mas como não sabiam qual colombiano foi, começaram a pegar-se com todos eles! Até que eu e mais alguns ciclistas de outras equipas tivemos que colocar um ponto final nestas cenas pois estavam a colocar em perigo todo o pelotão. Dissemos para resolverem as divergências após finalizar a etapa. De qualquer forma, os comissários é que não se aperceberam destas situação, senão ambos os ciclistas teriam sido expulsos.

Bem, isto leva-me a um outro assunto. A luta por um espaço no pelotão. Esta é uma das diferenças em relação ao BTT. Os ciclistas de estrada são bem mais agressivos! Lutam afincadamente pela melhor colocação no pelotão, muitas vezes utilizam a técnica do toque para conseguirem a melhor. Ou dão um toque com a mão no rabo do ciclista para se desviar, ou muitas vezes é com o próprio guiador. Isto não é novidade de agora. No meu tempo já era assim, mas muito menos frequente! Agora parece uma moda. A desavença que relatei há pouco entre um russo e um colombiano, foi por isto mesmo. Os colombianos gostam muito de ...tocar e acham que têm prioridade sobre todos os outros ciclistas na escolha do melhor “spot” no pelotão. Os russos não gostam que lhes digam para se desviarem, e como tal partiram para a chapada.

Mas este desrespeito entre colegas de profissão não é exclusivo dos colombianos. Acontece o mesmo entre equipas portuguesas. Algumas acham que são mais importantes que outras e como tal têm lugar cativo nas zonas VIP do pelotão. E qual é a zona VIP de um pelotão. Bem, quando o percurso é sinuoso e perigoso, o melhor lugar é logo a seguir à equipa que estiver a puxar pelo pelotão, regra geral a equipa do camisola amarela. Nesta zona há menos probabilidades de quedas e o esforço físico e psíquico exigido é bem menor. Estas equipas que se acham VIPs ou com mais direitos que as outras demais, querem colocar TODOS os seus ciclistas atrás da equipa que vai a fazer as despesas da corrida, ou seja a puxar, não deixando sequer que algum ciclista de outra equipa se intrometa no meio de todos estes VIPs.

Volto a dizer, “no meu tempo” a única equipa considerada VIP era a do líder da prova, e o único ciclista prioritário era o camisola amarela. Estes tinham preferência. O resto do pelotão era tratado de igual forma.
Mas pelos vistos existe uma nova edição do manual “Regras do pelotão”, mas eu ainda não o li!

Bem, esta crónica já vai longa. Vou deixar a parte que fala sobre a minha condição física atual, e a minha prestação nesta prova para a crónica de amanhã.

Quero só aproveitar para dar mais uma vez os parabéns ao meu colega Edgar Pinto que venceu a etapa de ontem de forma brilhante, moralizando desta forma toda a equipa LA-ANTARTE-ROTA DOS MÓVEIS. O Edgar é um dos favoritos à vitória na Volta a Portugal. Força Edgar!

E termino com a noticia que consegui mais um parceiro que me vai ajudar no apoio logístico à Volta a Portugal. Brevemente direi qual é.

Até amanhã

#VitorGamitonaVolta

1 comentário:

  1. As regras do pelotão são cada vez mais ignoradas no ciclismo de estrada. Para mim é confrangedor ver uma etapa da Volta à França com 40... e tal quedas numa etapa. Boas curvas Vitor

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